Páginas

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Calçada de Alpajares

     Ao chegar a Poiares, no passado 29 de Janeiro, a primeira coisa que procurei foi água. Vi um tanque de lavar a roupa,  completamente cheio, a transbordar. Não tinha torneira. A água caía livremente de um tubo, mas a queda era apenas de uns dois ou três centímetros - a distância a que o tubo ficava da superfície. Esta  circunstância fez-me duvidar da salubridade da água e, por isso procurei, em vão, alguém que me informasse acerca do assunto. Pelo sim, pelo não, enchi o cantil. Não sabia se encontraria mais água e a Calçada de Alpajares exigia uma boa provisão. Demos uns passos e eis que deparámos com duas senhoras. É claro que aproveitei logo o ensejo para me informar sobre a qualidade da água.
    - Bom dia. Por favor, a água do tanque é boa para beber?
    - A que sai do cano é; a que já está no tanque, não. Mas vocês gostam de andar?  O tom em que a senhora - que parecia a mais nova e deve rondar os cinquenta e cinco anos - formulou a pergunta, excitou o meu intelecto; parecia um misto de brejeirice, provocação e brincadeira.
     - Sim, gostamos de andar, retorqui. E com um orgulho incontido: Vamos fazer a Calçada de Alpajares.
     - Pois olhe - respondeu a senhora, no mesmo tom -  faziam bem melhor se nos ajudassem a cavar as nossas vinhas e os nossos olivais. E se calhar ainda se divertiam mais.
     A resposta que no momento me ocorreu foi jurar-lhe que era só dizer onde eram essas terras, que imediatamente todos nós lá iríamos e revolveríamos tudo num instante.
     Agradeci à senhora e começámos a marcha, que se revelou de uma beleza surpreendente. Até vimos uma águia recém-nascida no ninho, no alto de um penhasco.
     Não voltámos a ver a senhora. Mas a  provocação continua a bailar-me na mente. E ainda agora não sei se foi brincadeira  ou repreensão.